Uncharted 4: A Thief’s End é o refinamento máximo da franquia e um playground para o talento técnico, seja ele na parte visual, seja na parte sonora. Algumas produções que tivemos na geração anterior foram pretensiosas demais para tentar inserir no conjunto o quanto fosse possível de videogames tradicionais.
A Naughty Dog, desenvolvedora das franquias Uncharted e The Last of Us é uma espécie de Rare, que arranca suspiros até de pessoas que não estão 100% ligadas no mundo dos games. Isso fica claro em redes sociais, por exemplo.
Isso tudo porque ela consegue ser uma adaptação da inglesa para os dias de hoje onde, ao invés de trazer mecânicas da Nintendo ao máximo em jogos de plataforma com milhares de coletáveis, faz narrativa em jogos de um jeito facilmente conquistador, satisfazendo bastante seus investidores, neste caso a Sony. Seus personagens são fáceis de se embarcar, onde você compra as suas pequenas histórias utilizando aquele ouro ao qual você mais se apegava e, mesmo assim, sempre sente que foi um investimento que valeu a pena.
Uncharted 4 veio para encerrar a série de alguma forma e isso é louvável – quando a produtora sabe quando e onde parar. Se esta linha de respeito fosse ultrapassada depois disso, ficaria claro que a série estaria começando o seu declínio produtivo, pois mesmo na quarta edição o jogo já não conseguiu esconder com os lençóis mais limpos do mundo e boas intenções o quanto a parte de mecânica é provisória e como ela é perigosa. Ela está ali, sempre pronta, batalhando com a narrativa em meio de grandes explosões, alturas e paisagens. Louca para deixar o jogador com uma sensação de frustração e de que gostaria de estar realmente jogando algo. Felizmente esta batalha é vencida até aqui, neste quarto game, com bastante talento e jogo de cintura.
Nathan Drake é o jovem não tão jovem, com cara de quem está saindo de suas grandes aventuras, se esforçando à beça para se encaixar no mundo, no que o mundo diz que é certo de se ter: uma família, um casório, uma casa quentinha e não estranha para se dormir. Sua rotina de trabalho faz-lhe abrir um grande sorriso amarelo a cada dia, mas isso sempre está vazando por frestas e Elena, esposa de Nate sabe disso. Drake não está completo e seu espírito aventureiro sempre lhe chama.
Acontece que o gatilho que faltava para arrastá-lo de volta para esse perigoso mundo acaba de ser disparado quando, de repente, seu irmão aparece depois de anos, depois de ter sido dado como morto. Sam é um personagem que nunca foi mencionado na série anteriormente, mas o jogo trata de fazer boas explicações para incluí-lo na trama, já que ele é necessário para uma mecânica que faz parte da gameplay core de Uncharted 4: estar em dupla é uma constante aqui e, no rodízio de personagens, Sam é o motivador das aventuras que acontecerão nos mais de vinte capítulos de Uncharted 4.
Sam não está só de volta, como revive a promessa de encontrar um tesouro-mestre, aquele que define a personalidade e natureza dos irmãos.
Talvez a parte mais desafiadora para a equipe do jogo não tenha sido de colocar tudo certo em seu lugar, com cenas de ação espetaculares e orquestradas, que fazem uso pleno do hardware com maestria, não. O grande desafio é encaixar todo o motivo do jogo. O motivo para um setting acontecer em dado país, de Nate estar acompanhado de tal personagem desta vez, de como este rodízio de personagens é gerenciado em relação ao roteiro e mecânicas, de haver um motivo para um tipo de gameplay em determinado trecho, etc.
A parte de tiroteio está bem menos pertinente em Uncharted 4, dando lugar a muito mais escaladas e o que define melhor um caçador de tesouros. Existem tentativas de se fazer mais de um pequeno caminho, que tão logo se encontram. Existe o mascaramento efetivo de coisas como “a mão de Deus” que fazia o possível para Nate realizar gameplays com cadência scriptada, dando um pequeno peteleco em saltos que parecem impossíveis e perdidos.
Mas, sem dúvidas, esse é o capítulo da série com os settings mais bem escolhidos. O clima de ilhas perdidas e selvagens e mata com cachoeiras é uma recorrente na série, mas sinto que, desta vez, a coerência do desenrolar da história e dos próprios mapas é muito melhor executada.
O teor de narrativa aplicado ao jogo talvez seja a maior e melhor diferença em relação aos anteriores. Os conflitos mundanos e trejeitos dos personagens, que se misturam ao fantástico-mentiroso de toda ação, levam uma sensação reconfortante de um mundo em que gostaríamos de viver, com todas as coisas boas que a fantasia tem pra nos oferecer, mas sem nunca se esquecer do problemas do lado de cá, da realidade que, por suas vezes, traz carisma e identificação legítima e palpável.
Não é novidade, mas digamos que jogos como Uncharted 4 servem mais para uma narrativa altamente interativa do que uma experiência tradicional de videogames. Há uma repetição eminente de mecânicas, banhada por belos visuais como distração e um roteiro bem direto ao ponto, que agrada, por fim, e se torna uma alternativa de experiência que se chama “um videogame que é tão aproveitável quanto um cinema, de verdade, e não tá só tentando, pois já, sozinho, é superior a isso há tempos”. É uma experiência que balanceia o cosmos moderno, dando à nós mais uma opção diferenciada num ano de DOOM e seus mergulhos profundos em controles viciados e viciantes. Isso significa que a narrativa passiva do cinema é boa, mas ser narrado é bom demais!